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Tecnologia não torna as cidades inteligentes. Os cidadãos sim!

Recentemente, em sua coluna na rádio USP (Universidade de São Paulo), Luli Radfahrer, professor de Comunicação Digital, criticou o debate sobre “cidades inteligentes” com foco exclusivo em soluções tecnológicas, como se tudo girasse em torno da eficiência. “Está todo mundo querendo tornar mais ágil um sistema que não funciona direito, em vez de pensá-lo como um todo”, destacou.

Radfahrer explica que não adianta alguém criar uma forma de você chegar mais rapidamente ao trabalho, se você faz home office e não precisa mais ir ao trabalho. Os tempos são outros. “O problema da discussão das cidades inteligentes é pensar quais tecnologias serão aplicadas à cidade sem entender quais são os problemas da cidade”.

“Cidades não são inteligentes ou criativas. Os cidadãos que são ou não são. A cidade passa a ser inteligente a partir do momento em que o cidadão passa a exercer na prática esta sua inteligência”, ensina Ana Carla Fonseca, diretora da Garimpo de Soluções, empresa que fornece soluções criativas para cidades e negócios.

Em sua avaliação, há múltiplas formas de exercício da cidadania para a resolução de problemas das cidades. “O grande mote é desenvolver projetos que tenham como resultado o bem-estar não apenas das pessoas que lá vivem, mas de todos os seres vivos urbanos, como rios, árvores e meio ambiente em geral”, complementa Ana.

Independentemente do porte, uma cidade que se pretende criativa tem três caraterísticas fundamentais, segundo Ana: inovação no sentido amplo (da tecnológica à social), conexões também num sentido maior (entre as áreas de uma cidade, entre instituições, entre momentos de sua história, entre pessoas) e cultura (arte, mas, sobretudo, o espírito de cidade, sua essência, sua alma ou genius loci, como diziam os romanos).

Em São Paulo, ela cita vários projetos que são referência de como pensar melhorias para a cidade além da tecnologia, como o Movimento Boa Praça (de ocupação de espaços públicos) e a Virada Sustentável. “São projetos que expandem os vínculos com a cidade e o respeito ao outro”, explica. Ela menciona ainda o projeto OpenCity Lab, que aproxima empresas inovadoras de startups que promovem impacto urbano positivo, como todo tipo de melhoria da qualidade de vida na cidade, da mobilidade à educação. “Estas empresas inovadoras têm atrelado a seu modelo de negócio e estratégica um vínculo muito grande com a cidade”.

Um exemplo simples de como construir a cidadania com foco em benefícios às cidades é engajar as crianças neste processo, porque elas não são apenas o futuro das cidades, são também agentes de transformação, influenciam suas famílias.

Em Lisboa, cita Ana Carla Fonseca, há um projeto de orçamento participativo cidadão nas escolas públicas. A prefeitura disponibiliza um volume baixo de recursos financeiros a alunos de 12 a 18 anos e eles têm de decidir onde aplicar estes recursos. “Eles se mostraram muito mais preocupados com questões da cidade, como restaurar uma calçada em que idosos costumavam tropeçar, do que com questões de interesse só deles”, revela. Em outro projeto, da Itália, crianças bem pequenas saem pelas ruas para “multar” quem causa problemas à cidade, como estacionar em local proibido.

Um ponto forte das atividades da Garimpo de Soluções é fomentar o trabalho colaborativo, tendo a cidade como um espaço de todos. “A sociedade civil clama por seus direitos, mas ao mesmo tempo tem um papel a exercer, tem suas responsabilidades, como zelar pela cidade, respeitar e não invadir o espaço do outro, ouvir a voz do outro”, ressalta.

“Não há transformação de cidades sem a participação conjunta de vários agentes (governos, setor privado, sociedade civil e academia). Independentemente de quem dá o primeiro passo, acende o fósforo para uma ideia, indica que há um caminho, outros agentes devem participar, trazer oxigênio para os projetos. Quando atuamos de forma colaborativa, aquela chaminha inicial se torna fogo permanente”, diz Ana.

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