A primeira semana do Brasil foi marcada por forte intensificação dos movimentos de aversão a risco por conta do coronavírus no mercado internacional, que refletiram fortemente nos ativos locais. Ademais, a atuação extraordinária do FED e o fraco crescimento do PIB local no ano passado também merecem destaque.
No cenário externo, observamos a manutenção dos movimentos de aversão a risco observados na semana passada. O ativo mais evidente neste sentido foi o fechamento da estrutura a termo americana, com os juros marcando novos patamares de mínimos histórico. Especificamente o juro de dez ano anos americano chegou a ser negociado no patamar de 0.65bps. Vale lembrar que no começo do ano o juro sobre o mesmo ativo era de próximo a 1.90%.
Reagindo ao aperto das condições financeiras, o FED atuou de maneira extraordinária pela primeira vez desde outubro de 2008, cortando a taxa básica de juros em 50bps (para a banda de 1.00-1.25%). Destaca-se que na conferência de imprensa após a decisão, Powell manteve a porta aberta para mais intervenções. Assim, o mercado estima que o FED cortará mais 90bps ao longo deste ano. A estimativa da casa centra-se em mais 50 bps de afrouxamento monetário, com 25bps de corte em cada uma das próximas reuniões. Naturalmente, a evolução das condições financeiras (leia-se, o conjunto de ativos do mercado que ajudam a galgar o real preço do dinheiro além do juro definido pelo FED) serão fator fundamental na definição do juro a frente. Ou seja, caso as condições financeiras voltem a deteriorar de forma significativa, o FED atuará de forma mais forçosa para dar suporte ao mercado.
No campo político, destaca-se o excelente desempenho de Joe Biden na super Tuesday e o péssimo desempenho de Michael Bloomberg. De domingo 01/03 a quarta-feira 04/03, os principais concorrentes de Biden ao centro do partido democrata desistiram da corrida presidencial e endossaram o ex-vice-presidente. Ao mesmo tempo, Bernie Sanders teve desempenho aquém do esperado, tal qual Elizabeth Warren, que também desistiu da corrida presidência. Assim, confirma-se o cenário da primária democrata entre Biden e Sanders. Por sua vez, isto eleva a probabilidade de uma eleição entre Biden e Trump, o que é positivo a preços de mercado.
No Brasil, destaca-se a atuação errática do BC ao longo da semana. Primeiramente, o BC anunciou na terça-feira, na esteira da ação do FED, uma nota que indicava novo corte da taxa SELIC por conta dos riscos postos pelo coronavírus. No dia seguinte, a curva ganhou inclinação considerável, com fechamento das taxas curtas e abertura das taxas longas. Por sua vez, o dólar chegou a novos patamares recorde em termos nominais, o que ensejou atuação da autoridade monetária via swaps.
Ressalta-se aqui a contradição entre a comunicação de mais cortes e atuação contra a desvalorização da moeda. Pela primeira vez, discutiu-se de forma aberta no mercado a possibilidade de o Banco Central ter deixado o dólar contaminar os mercados de renda variável e juros, ao mesmo tempo em que a maior inclinação da curva indicava a possibilidade de um policy mistake por parte do COPOM. Destacamos que o dólar nos patamares atuais pode estar afetando a confiança do investidor em relação ao projeto liberal implementado pelo governo. Isto acaba neutralizando o efeito positivo sobre exportações que a moeda nacional enfraquecida poderia gerar.
No campo político, mais desavenças entre o presidente e o legislativo por conta do Orçamento Impositivo marcaram o tom da semana. Ao mesmo tempo, segue a especulação sobre uma possível “data de validade” para o ministro da economia Paulo Guedes e sua equipe por conta da anêmica atividade local.
Mantemos a mesma conclusão de semana passada: acreditamos que o mercado possa estar marginalmente exagerado quanto a magnitude da desaceleração global. Ainda assim, recomenda-se extrema cautela na alocação de recursos. A redução da exposição de fundos locais à bolsa pode levar a uma simultânea redução na necessidade de hedge via dólar, o que pode levar a pressão compradora de real.
Adendo:
Ao longo do final de semana fomos surpreendidos pelo anúncio de que a Arábia Saudita pretendia aumentar a produção diária de petróleo a partir de abril após o encontro fracassado da OPEP+ na semana passada. Pelo anúncio saudita, a produção passaria de 10 milhões de barris de petróleo por dia, podendo chegar inclusive ao patamar de 12 milhões de barris de petróleo por dia.
Esta notícia fez-se sentir ao longo do dia de ontem de forma significativa: o choque do petróleo afeta especialmente a economia americana, dado que esta é atualmente exportadora da commodity e que os produtores americanos necessitam preço de petróleo mais elevado do que alguns de seus concorrentes.
Assim, aumentou pressão sobre o mercado de crédito americano (abertura das taxas high-yield) ao mesmo tempo em que aumentaram de forma significativa as apostas sobre uma possível recessão. O efeito disto foi a queda vertiginosa observada em todos os mercados na segunda-feira (09/03).