A ansiedade pela próxima temporada de Game of Thrones, o desejo insano de devorar, em apenas um dia, episódios em sequência de Grey´s Anatomy ou The Walking Dead. Enfim, assistir a séries de TV tornou-se, nos últimos anos, mania no mundo todo. Mas o que esse comportamento que beira a compulsão afeta o dia a dia das pessoas?
A psicóloga Graça Maria Ramos de Oliveira, do Serviço de Psicologia e Neuropsicologia do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas, em São Paulo, conta que os profissionais de sua área têm mostrado preocupação com o binge-watching, termo para o comportamento compulsivo de assistir a séries. A tecnologia, claro, tem grande responsabilidade para criar e fomentar este vício. As pessoas acessam as séries em apenas um click, podem consumi-las em aparelhos que são transportados a qualquer lugar e têm a opção de escolher a melhor hora do dia para vê-las.
Para identificar se este comportamento está interferindo negativamente na vida de uma pessoa, a psicóloga sugere algumas questões: ela cancela compromissos para assistir a séries? Torna-se mais isolada? Isso interfere em seu trabalho? “Um estudo da Universidade do Texas descobriu que, quanto mais solitária e deprimida a pessoa for, maior a probabilidade de apresentar binge-watching, como forma de afastar sentimentos negativos e de esquecer uma realidade não tão prazerosa”, ressalta Graça.
A psicóloga do HC de São Paulo menciona também o artigo Stop Binge-WatchingTV, em que o escritor Jim Pagels faz um alerta: “Nossos melhores amigos são os que vemos de vez em quando por anos, e os personagens da TV devem ser da mesma maneira”. Ou seja: para o escritor os personagens de TV mais marcantes são aqueles que acompanham uma parte regular de nossas vidas, como nossos verdadeiros amigos. Não alguém com quem saímos por 24 horas durante sete dias da semana e depois nunca mais vemos.
Mas curtir séries também tem reflexos positivos. Uma pesquisa recente encomendada pela operadora americana Xfinity à Propeller Insights e divulgada no site de entretenimento The Wrap (original aqui) com quase 2 mil fãs de TV entre 25 e 49 anos, indicou que 66% dos casais dizem que assistir à TV juntos fortaleceu a relação.
“Esse hábito pode ser extremamente saudável ao aproximar o casal, proporcionando intimidade e o compartilhamento de afinidades”, diz Graça Oliveira.
A mesma pesquisa revelou, entretanto, que 50% dos casais admitiram a prática de TV cheating, que significa assistir a um programa sem o parceiro ou a parceira, ser um tipo de “traição”. Já para a psicóloga do HC, a busca por independência é saudável. “Um casal se fortalece quando os dois crescem juntos, quando os dois têm interesses comuns, mas também quando mantêm a identidade e a essência individual”, explica.
Outro dado interessante da pesquisa é que 43% dos solteiros da Geração Y (os millennials) já foram a um encontro motivados, sobretudo, pela preferência televisa do possível parceiro ou parceira. Se, no caso, a preferência for a mesma que a sua, aí a identificação é total. Para Graça Oliveira, trata-se de uma geração que se afasta do amor romântico e suas decisões nas escolhas amorosas estão se tornando mais lógicas e racionais. Há também a necessidade de gratificação instantânea. Tudo para eles é alcançado de forma imediata.
“Não existe tanta tolerância a diferenças ou a pequenas falhas do parceiro. É uma geração que tende a acreditar na perfeição. Escolher alguém com base nas mesmas preferências pessoais, como amarem a mesma série de TV, pode ser uma tentativa de evitar o erro”, conta Graça.
Mas… perfeição não existe, nem mesmo nos roteiros dos melhores seriados.